COLUNA

O novo recurso do WhatsApp e os grupos que poderiam ser um convite

Thays Pretti

Empresa anunciou novos recursos do aplicativo e a possibilidade de deixar um grupo silenciosamente é revolucionária demais para não ser exaltada

Alguém te coloca em um grupo no WhatsApp. Talvez haja um fim específico, um passeio ou uma festa, mas nem sempre te comunicam de antemão o motivo para te colocarem ali. De repente, você é lançado entre outros números de telefone, alguns conhecidos, outros não.

Às vezes, te inserem no meio de algo que já está em andamento e você não entende bem, não sabe de datas nem horários. As pessoas combinam coisas e mandam figurinhas enquanto você tenta se situar.

Você timidamente pergunta o que está rolando, alguém repete uma informação que soa como óbvia ou reencaminha uma mensagem com o que você precisa saber. Você entende. É uma obrigação entender, uma vez que, em breve, alguém mais será inserido no grupo e esse reencaminhamento se repetirá. Logo, você terá lido tantas vezes sobre o que os reuniu ali que, como um chimpanzé adestrado, será capaz de repetir tudo quase automaticamente.

É assim que começam os grupos.

Infelizmente, porém, nem sempre eles acabam. Digo, pelo menos no caso dos grupos que precisam acabar, esses específicos, os quais eu batizei com carinho de: “grupos que poderiam ter sido apenas um convite”.

Publicidade

Eles não têm um objetivo permanente. Não são o grupo da família, o grupo do trabalho, o grupo de alguma atividade regular que você faça ou aquele grupo da fofoca, com uns poucos amigos próximos. Não. No caso dos grupos que poderiam ter sido apenas um convite, depois de o objetivo inicial ter sido alcançado e as fotos terem sido encaminhadas, surge aquela grande e gosmenta bolha de constrangimento, quando todo mundo gostaria muito de não estar mais ali, mas sem jeito de dar o primeiro passo. É que, como até então o aplicativo avisava sobre a saída de um membro, a gente se sentia na obrigação de se justificar, para não “ficar chato”. Brasileiro é obcecado por evitar climão, somos os paladinos da boa vizinhança.

Se a pessoa que criou esse tipo de grupo for minimamente humana, com responsabilidade afetiva e bom senso, ela terá a iniciativa de desmanchá-lo ela mesma. Se isso não acontecer, em algum momento alguém tomará coragem, dirá que tem muitos grupos para acompanhar ou que está fazendo um detox de redes sociais e sairá. Algumas pessoas seguirão o primeiro, usando pequenas variações dessas justificativas.

Você precisa sair nessa primeira leva.

Se não fizer isso, surge uma segunda onda de constrangimento, em que as pessoas começam a se preocupar em não sair todas de uma vez, já que quem criou o grupo não o decretou como encerrado. Você, então, não tendo saído, corre o risco de ficar preso indefinidamente entre pessoas que talvez nem conheça, nem goste, mas às quais se mantém unido por um desconfortável sentimento de consideração, sem um direcionamento claro.

Para sair do grupo depois disso, só após algum tempo (meses?), quando alguém surge novamente com a ideia do detox de redes sociais, e você pode “pegar um vácuo”. Entretanto, você já deve ter sido adicionado em pelo menos mais três durante esse meio tempo. É quase um esquema de pirâmide.

Nesses casos, o novo recurso do WhatsApp, que permite a saída silenciosa de grupos, será muito útil. Bastará esperar aquele momento em que a conversa pós-evento esfria e… pronto. Uma elegante saída à francesa. Você pode mandar uma mensagem privada para o organizador do grupo (que ainda será notificado da sua saída) falando do seu detox, mas, evitando a saída em debandada, evita-se também seus constrangimentos coletivos. Com a finesse da boa vizinhança respeitada, os paladinos podem depor a espada em paz.

Esse novo recurso, porém, prejudica outro motivo pelo qual as pessoas saem de grupos, também tipicamente brasileiro e, talvez, herdado dos portugueses: o narcísico desejo de fazer uma bela cena.

Publicidade

É que, naqueles grupos mais agitados, com muito debate e discussão, como os grupos de família, amigos, atividades diversas, sempre tem aquele(s) que decide(m) mostrar sua contrariedade em relação a algo saindo do grupo. Às vezes é uma saída anunciada, um ameaçador “então vou sair do grupo”. Outras vezes, a própria notificação da saída é a mensagem retumbante que se quer transmitir.

Em todo caso, me parece que, muitas vezes, na verdade, esse gesto é reflexo apenas do desejo de ser resgatado(a) de volta, de ter as opiniões seguidas, ouvidas, respeitadas, ou então de manifestar certo despeito em relação à pessoa amada. É como se fosse um equivalente virtual de “sair batendo a porta”, também bastante eficiente, dramático e pungente.

Não digo que essa saída nunca seja sincera. Longe disso. Já saí de grupos com os quais não me identificava mais e, quando vieram me perguntar se eu queria que me colocassem de volta, respondi: “não, obrigada, estou bem assim”. Já aconteceu e, nesses casos, acho que o novo recurso também é bastante útil. Quando acaba a identificação com um grupo, às vezes tudo o que a gente quer é poder sair sem fazer alarde.

Mas, o que mais me preocupa no momento é saber: o que será do natural impulso dramático brasileiro sem portas virtuais para bater? Será que o “então vou sair do grupo” vai ter o mesmo efeito se não for seguido da notificação da ameaça colocada em prática? Não sei. Porém, eu sinceramente acho que o WhatsApp deixará órfãos alguns de seus usuários, esses que, muitas das vezes, somente desejam a fantasia do resgate e a possibilidade de dizer, parafraseando Dom Pedro, que “se é para o bem de todos e felicidade geral da nação, digo ao grupo que fico!”

* Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do Dicas de Mulher.

Escritora, autora de "A mulher que ri", "Efêmeras" e "Do Silêncio". Apaixonada por Clarice Lispector, clubes de leitura e pessoas. Gosta de listar coisas de três em três.