Sociedade

Mulher gorda: rompendo padrões para habitar um corpo socialmente invisibilizado

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Atualizado em 16.04.24
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A gordofobia é um grave problema social que se manifesta de diversas formas, desde comentários ofensivos até discriminação institucional. Na diversidade de corpos, perpassada pelos padrões de belezas, há espaço para as pessoas gordas? A cineasta e designer Mariana Mussi, autora do documentário “Gordos não vão para o céu”, conversou com o Dicas de Mulher sobre o tema. Ainda, Mércia Pires, criadora da MaisGG Moda Plus, esclarece dúvidas relacionadas à moda. Acompanhe!

O que é ser gorda?

A pessoa gorda está sempre à margem: “uma vida, um processo de autoaceitação contra a sociedade que te vê como anomalia, bomba relógio, ofensa moral e visual. Me olho no espelho e me acho gata. Não entendo ser tão invisível. Nunca entendi. É entender que você tem um metabolismo diferente”. Ainda, Mariana explica que há vários espectros em ser gorda, mas todos são generalizados em uma única esfera.

Por que é importante usar o termo gorda?

Durante anos, a palavra gorda foi usada com uma conotação pejorativa. A intenção era humilhar e inferiorizar a mulher fora dos padrões de beleza propagados pelas mídias. Não há vergonha em não se enquadrar em uma caixinha. É preciso reconhecer a diversidade de corpos.

“Eu sou gorda, é a minha forma física e hoje falo sem medo. É parte da ressignificação da palavra gorda, empoderamento feminino, movimentos e novos termos que abraçam todas as formas. Exemplo: Gorda menor, gorda maior”, finaliza Mariana.

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O que é gordofobia?

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O corpo perfeito não é o gordo – na imagem propagada socialmente. Você pode estar com todos os exames em dia, a saúde ótima, porém, se é uma pessoa gorda, sabe que será olhada diferente. Você é cobrada para definir as curvas, emagrecer, comer menos, colocar uma roupa mais larga. A gordofobia é fatal.

Há muitos comerciais dizendo que a obesidade mata, entretanto, quantas vezes você viu uma notícia sobre os danos da gordofobia? Esse tipo de preconceito afeta a saúde mental, desencadeia depressão, transtornos alimentares e, não raro, casos de suícidios. Como relata Mariana:

É Sentar em um banco e a pessoa se levantar por nojo. Isso quando existe um banco para sentar-se. É não ter uma maca no hospital que suporte nosso peso. Ver uma mãe chorando, gritando, ninguém fazer nada e seu filho falecer. É ir ao cinema que tem marcado cadeiras para obesos e a poltronas são iguais as demais que não lhe cabe. É não ter emprego, porque 7 em cada 10 empresas não aceitam pessoas gordas. Ser nomeada como preguiçosa e menos capaz.

– Mariana Mussi

A gordofobia está na estrutura social, na falta de inclusão de corpos gordos, nos supostos elogios, como – ‘nossa, você emagreceu, está mais bonita’. É sobre entrar em uma loja e escutar – ‘infelizmente, não temos roupas para o seu tamanho’. No almoço de família, uma tia soltar – ‘seu rosto é tão lindo’. Enquanto a pessoa magra é vista como bonita, enteligente, com um futuro promissor, a gorda é vista como engraçada, atrapalhada, um pecado capital.

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Como lidar com a gordofobia?

Mariana conta que já sofreu ameaças nas redes sociais. “Aconteceu recentemente por um suposto professor de educação física e YouTuber. Ele enviou um áudio dizendo que eu deveria fazer um favor e ficar dentro de casa, pelo ‘bem da sociedade’. Por que? Porque viu que tenho fotos normais no Instagram, que sou uma pessoa normal igualmente todas”.

Atualmente, há vários grupos espalhados pelo país, como o movimento body positive, redes de apoio, encontros e diálogos. Contudo, é preciso lembrar que só a positividade não resolve problemas. O ativismo precisa ser cada vez mais libertário. “Se você não é uma influencer, não tem muito acesso, visibilidade, não fica muito clara a realidade de pessoas gordas”.

Mulheres gordas e relacionamentos

As pessoas gordas enfrentam uma série de desafios em relação aos relacionamentos. Infelizmente, a sociedade impõe estereótipos de casais perfeitos. Se um homem namora uma mulher gorda, é porque ele conseguiu enxergar a beleza interior dela. Dessa forma, muitas sofrem rejeição, descrédito e objetificação.

A solidão da mulher gorda

A solidão da mulher gorda é atravessada pela falta de gentileza, pela invisibilidade. É se sentir sozinha mesmo rodeada de pessoas, “não ter um toque de carinho ou um abraço espontâneo. Um namorado, marido. Viver de migalhas. Desde ausências de afeto familiar até círculo de amizades. Eu sou a amiga que não está nas festas de aniversário, nos rolês de sábado à noite, nas menções em redes sociais, nas fotos. Sempre no sigilo”, desabafa Mariana.

A pessoa gorda sai para jantar sozinha, vai ao cinema sozinha, não precisa receber flores. Mariana conta que é comum escutar: “até tenho amiga que é gorda. Até já gostei de uma moça gorda. Até já fiquei com uma moça gorda”. Porém, corpos gordos continuam invisíveis, até quando?

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Relacionamentos abusivos

Viver um relacionamento abusivo é uma situação extremamente difícil e, quando se trata de uma mulher gorda, a complexidade aumenta. Infelizmente, muitas mulheres gordas estão vuneráveis à violência psicológica, são alvos de abusos físicos e verbais. Nas palavras da cineasta:

Eu acreditava que estava vivendo um conto de fadas. No entanto, acabei coagida e envolvida em um abuso. Quando expressei meu desejo por algo além de um encontro casual, fui ignorada. Essa situação me levou a uma profunda depressão, enquanto ouvia comentários – ‘você é linda, mas precisa fazer alguns ajustes e emagrecer um pouquinho’.

– Mariana Mussi

As violências propagadas contra pessoas gordas estão tão naturalizadas na sociedade que, na maioria das vezes, não são lidas como tais. A mulher aceita um comentário maldoso do parceiro, leva na brincadeira e acha que é normal. Outras vezes, suporta a violência porque foi criada socialmente para acreditar que não merece algo melhor, não merece ser feliz. Não, não é normal. E, sim, o corpo gordo merece algo melhor.

Fetichização

O fetiche, objetificação e hipersexualização do corpo gordo é real. Nas buscas de filmes pornôs, mulheres gordas estão entre as mais procuradas. “Com frequência, sou abordada por caras mandando dm e mensagens privadas para ir ao motel, ou homens casados. Se você se nega, é uma afronta. Eles chegam com a cara de pau, como se eu realmente fosse atende-los, e tenho essa obrigação. A mulher gorda é sempre vista como desesperada ou que topa tudo por ser sozinha”, explica Mariana.

É preciso entender que ser gorda vai além da aparência física, abrange uma diversidade de experiências e identidades. É necessário olhar para fora, exigir mudanças, inclusão e respeito. Entretanto, não esqueça de olhar para você, buscar a autoaceitação e o amor-próprio. O corpo é identidade, é você no mundo. Não tenha vergonha de ser.

Mulheres gordas na moda

As mulheres gordas estão rompendo barreiras, redefinindo padrões de beleza e celebrando a diversidade de corpos. Contudo, ainda há muito a ser feito. Abaixo, a especialista em moda plus size e coloração pessoal, Mércia Pires, esclarece pontos importantes sobre esse universo.

Diferença de plus size para mid size

“Segundo as normas de vestibilidade, acima de 44, é considerado plus size. Porém, em muitos lugares, decidiram dividir o termo e usar midsize para se referir aos tamanhos de 44 a 50. Considerando plus size, acima de 52. Contudo, na maioria das lojas plus, hás looks de 44 a 52/54. Já os tamanhos maiores ficam para lojas especializadas”, explica Mércia.

Moda praia

“Por muito tempo, nós gordas tivemos nosso estilo podado, por assim dizer. Só se usava o que cabia, e se vc quisesse algo diferente, tinha que recorrer à costureira. Apesar de a realidade ter começado a mudar, eu ainda vejo campos para melhoras”. Por exemplo, há uma diferença gritante no preço entre as roupas para mulheres gordas e a moda que ganha as vitrines.

Sobre biquínis e maiôs pluz size, a moda praia em geral, “hoje conseguimos observar uma grande variedade de peças para os diferentes gostos. Existe a plus que é mais ousada e que hoje já consegue encontrar biquínis mais cavados. Além disso, a mulher que prefere tecidos mais encorpados para dar sustentação ao seio ou para moldar o corpo já pode contar com modelos específicos. O que eu tenho visto de mais inclusivo é podermos encontrar um mesmo modelo tanto no tamanho slim como plus”, conta a empreendedora.

A evolução no mundo da moda reflete um movimento maior em direção à inclusão e à celebração da diversidade de corpos, permitindo que todas as mulheres se sintam confiantes e empoderadas. Porém, como apontou Mércia, esse é só o começo, ainda é preciso melhoras.

10 Influencers gordas para você seguir

Abaixo, conheça influenciadoras que oferecem conteúdos variados, incluindo moda, estilo pessoal, bem-estar mental e mensagens de empoderamento. Siga perfis diversificados, fure a bolha das redes sociais e conheça outras realidades. A representatividade é importante no processo de autoconhecimento e na visibilidade da mulher gorda.

Luiza Junqueira

Luiza é uma comunicadora que se destaca por sua abordagem do autocuidado, que vai além da aparência. Com uma visão única, ela compartilha mensagens inspiradoras sobre bem-estar emocional, autoaceitação e autoestima. Com isso, incentiva seus seguidores a cuidarem de si.

Alexandra Gurgel

Ativista de body positive e feminismo, destaca-se por sua defesa da inclusão e representatividade. Com mensagens empoderadoras e autênticas, Alexandra incentiva a autoaceitação, o amor-próprio e a quebra de estereótipos. Por meio de um conteúdo diversificado, abordando moda plus size e questões sociais, ela inspira a construção de uma mentalidade positiva em relação ao corpo.

Ju Romano

Ju Romano é uma blogueira de moda plus size e uma forte ativista do movimento body positive. Compartilhando looks estilosos e oferecendo dicas de moda, ela desempenha um papel crucial ao promover a aceitação corporal. Em suas postagens, Ju incentiva seus seguidores a abraçarem suas individualidades e a se sentirem confiantes em seus corpos.

Mariana Xavier

Atriz e escritora engajada, Mariana Xavier utiliza suas redes sociais como plataforma para compartilhar mensagens positivas sobre autoestima e aceitação corporal. Ela emprega suas habilidades artísticas para quebrar preconceitos, inspirando seus seguidores a abraçarem suas imperfeições e a se amarem incondicionalmente.

Gaby Amarantos

Gaby Amarantos é uma cantora, compositora e influenciadora que defende a aceitação e valorização de corpos gordos. Ela utiliza suas redes sociais para promover o empoderamento feminino, a autoaceitação e a representatividade.

Bell Rocha

Bell Rocha é uma influenciadora brasileira que enfrentou dificuldades ao buscar biquínis que se adequassem ao seu corpo. Determinada a fazer a diferença, ela lançou sua própria linha de moda praia para mulheres gordas. Agora, além de promover a autoaceitação, Bell cria looks perfeitos para o verão, auxiliando suas seguidoras a amarem seus corpos.

Mc Carol

Mc Carol é uma cantora brasileira conhecida por suas letras empoderadas e pelo ativismo social. Além de seu trabalho musical, ela usa suas redes sociais para quebrar estereótipos relacionados ao corpo gordo.

Lizzo

Com sua poderosa voz e letras inspiradoras, Lizzo promove a autoaceitação e a positividade corporal. Ela celebra a diversidade de corpos e encoraja seus fãs a se sentirem confiantes. Nas redes sociais, mostra que a mulher gorda pode tudo.

Rita Carreira

Rita Carreira, uma modelo plus size brasileira, é reconhecida por sua beleza e por enfatizar a importância da representatividade como uma mulher negra e gorda. No entanto, seu caminho não foi fácil. Em uma entrevista à Vogue, Rita revelou que já sofreu preconceito por ser negra e por considerarem que seu tamanho não é adequado para uma modelo plus size. Apesar dos obstáculos, continua desafiando os padrões de beleza e inspira outras mulheres.

Kellie Brown

Kellie Brown é uma influenciadora que aborda temas relacionados à moda, autoestima e diversidade. Ela compartilha looks estilosos e mostra que a mulher gorda pode se vestir como quiser.

Ao ampliar a diversidade de corpos nas mídias, é possível abrir espaços, colocar a inclusão em pauta, bem como refletir sobre diferentes vivências. As redes sociais criam bolhas e, no geral, acabamos consumindo sempre o mesmo conteúdo. Por isso, procure seguir mulheres fora do padrão, indique, compartilhe e não invisibilize existências.

Graduada em jornalismo, apaixonada pelo mundo da comunicação. Geminiana em busca de novas aventuras e extremamente viciada em gatos. Obcecada por passar o tempo livre me alienando com futebol.