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7 escritoras contemporâneas para conhecer o papel da mulher na literatura

Tatyana Domen / Dicas de Mulher

Atualizado em 01.03.24

Você já se perguntou por que lemos mais homens do que mulheres? Basta dar uma olhada nos livros expostos em livrarias ou até mesmo na estante que você tem em casa para perceber que, sim, infelizmente acabamos consumindo mais produções literárias de homens. Vamos falar sobre a mulher na literatura? Vem comigo!

A questão histórica

Tatyana Domen / Dicas de Mulher

Quantos livros escritos por mulheres você já leu na escola? Esse é um ponto importante para levarmos em consideração. Eu sempre gostei muito de ler, comecei por clássicos infantis, como todo mundo. Chapeuzinho Vermelho, do Charles Perrault, Branca de Neve e Cinderela, dos irmãos Grimm, e alguns livros da “Série Vaga-Lume” fizeram parte da minha infância, principalmente os livros do Marcos Rey. Como você já deve ter percebido, são livros escritos por homens. Eventualmente, caiam em minhas mãos obras da Ana Maria Machado. Por que as escolas não incentivam a leitura de escritoras? Seria muito bacana crescer sabendo que, sim, mulheres escrevem! E na medida do possível, melhor ainda seria ver um olhar feminino sobre a vida.

Mas será que as mulheres de fato escreviam? Comecei a ter conhecimento de fato que as mulheres produziam literatura no final do Ensino Médio de uma escola pública. Dei sorte de ter uma professora de Língua Portuguesa que amava livros. No terceirão, estudando literatura da segunda geração do Modernismo (a partir de 1930) fiquei sabendo de Cecília Meireles, Clarice Lispector e Lygia Fagundes Telles. Eu nunca entendi por que demorou tanto pra mulheres aparecerem na lista de obras que tínhamos que ler, mas não questionava isso e não sei se minha professora na época tinha essa percepção.

Durante os anos que fui professora de Literatura, eu levei esse questionamento para os meus alunos e expliquei que, sim, mulheres podiam escrever, mas que para isso, elas precisavam ser alfabetizadas… No Brasil, a partir de 1827, o ensino público e gratuito foi sancionado no país e as mulheres passaram a ter o direito à educação. Contudo, um ponto importante é que nem todas as mulheres tinham acesso à educação, que era possível somente para elite, excluindo pessoas pobres e negras.

Não sei muito da sua história, mas posso falar da minha mãe. Nascida nos anos 70, foi criada para ser uma boa esposa e mãe. Estudar nunca foi prioridade e é por isso que ela só frequentou a escola até a 4ª série. Como esperar que ela, com pouca escolaridade, se dividindo entre filhos, marido, casa e trabalho, conseguisse escrever literatura? Usei o exemplo da minha mãe para que seja fácil entender que escrever está muito além de apenas querer e ser criativa.

Voltando ao Modernismo, temos um outro ponto: a literatura era (ainda é) um espaço dominado por homens! Os livros que chegam até nós pela escola são sempre livros escritos por homens e assim continuou até por volta de 1930. Eram os homens das letras que ditavam o que era ou não literatura, sobretudo por sempre terem acesso a uma educação formal e culta, por meio de livros e demais aparelhos culturais. Lugar de mulher era, infelizmente, a casa, seja dos pais ou do marido, em posição inferior e submissa.

O que Cecília, Clarice e Lygia tiveram em comum? A possibilidade de estudar, devido a uma condição socioeconômica diferente de tantas outras mulheres e, claro, uma família que via importância na instrução e na arte. Pertencer a uma família abastada fazia toda a diferença naquele período. É só ver o caso de Maria Firmina dos Reis, primeira romancista mulher no Brasil, que era negra e pobre. Até poucos anos estava “desaparecida”, seu romance Úrsula foi publicado em 1859, mas foi esquecido. Na escola, apenas falamos de homens como Machado de Assis e José de Alencar.

O Modernismo foi um importante marco para as mulheres, porque ele simboliza uma porta que se abre, com visão para um país onde mulheres escrevem, publicam e são lidas, sobretudo por mulheres que buscam ser representadas enquanto personagens de obras literárias, sem esteriótipos machistas e achismos, e ler acerca de temas variados que as interessavam.

Falei tudo que é importante sobre a chegada das mulheres ao meio literário? É claro que não, essa publicação é só uma pequena pincelada sobre toda uma trajetória. A ideia é te fazer pensar e querer saber mais sobre esse assunto. Agora vamos falar sobre a literatura hoje?

O cenário atual

Tatyana Domen / Dicas de Mulher

Atualmente, a cara do mercado editorial tem mudado, ainda que aos poucos. Reivindicações e lutas de movimentos, como o feminista, indígena e negro, fazem toda a diferença nesse contexto. Além de políticas públicas e culturais que reconheçam as minorias e lhe deem a possibilidade de crescer, sem precisar nascer em uma família abastada ou ter de se esforçar dez vezes mais para ter acesso à educação e cultura, o que deveria ser um direito de todo cidadão.

Pesquisas como a da professora Regina Dalcastagnè mostram que a literatura contemporânea, principalmente aquela publicada por grandes editoras, é um espaço ainda dominado por homens brancos, héteros e de classe média ou alta. E o mesmo vale para personagens criados por esses escritores. Como esperar representatividade? Ou seja, as minorias não têm chegado às editoras maiores e, assim como na sociedade de modo amplo, têm sido excluídas. Dentre essas minorias estão as mulheres, e mais excluídas ainda são mulheres negras e indígenas.

Contudo, editoras menores, ainda com pouco reconhecimento no cenário nacional, têm acolhido essa parcela da população. Mas a pergunta que não quer calar é: você compra livros de editoras diversas ou só aquelas que têm grande espaço no mercado editorial? Boa parte dessas editoras não estão em sites como a Amazon por uma série de motivos burocráticos e financeiros. Resta você comprar os livros direto do site da editora ou mesmo com as autoras, por intermédio das redes sociais, com direito a autógrafo.

Mulheres têm conseguido ocupar espaços no mercado editorial, nos mais diversos cargos. Passaram a ser editoras, diagramadoras, ilustradoras, capistas, revisoras etc. Isso não só aumenta a quantidade de mulheres nesse mercado, mas também cria um novo olhar para o objetivo livro e a representatividade de suas histórias.

Editoras e selos editoriais que publicam mulheres têm tido destaque. Para citar alguns, temos o selo Rosa dos Tempos, da editora Record; o selo Autoras, da editora Penalux; a editora Quintal Edições, entre outras, que aliás tem mulheres à frente das publicações, não só como escritoras.

Eventos literários, como a Festa Literária Internacional de Paraty (FLIP) e a Festa Literária Internacional de Maringá (FLIM), passaram a ter um olhar mais atento ao número de escritoras que são convidadas para as mesas e lançamentos. Clubes de leitura passaram a dar mais visibilidade às autoras, um exemplo é o #LeiaMulheres, dedicado exclusivamente a ler autoras, nacionais e estrangeiras, e que está em mais de 100 cidades do Brasil.

Os pontos mencionados são alguns dos elementos que fizeram a mulher ter maior visibilidade na literatura atualmente. Claro que cabe a nós, como leitoras, buscar ler o que produzem as mulheres e divulgá-las também.

As escritoras contemporâneas

Tatyana Domen / Dicas de Mulher

E por que lermos mulheres contemporâneas? A resposta, pra mim, é simples. Primeiro porque há uma quebra de silenciamento. Durante anos, mulheres estiveram caladas em suas casas. Suas vivências, desejos e embates eram todos silenciados. Agora, por meio da literatura, muitos assuntos são abordados, os quais vão além do universo hétero, branco e de classe média ou alta, ou seja, estamos diante da pluralidade de vozes.

Infelizmente, as mulheres que, hoje, têm mais acesso ao mercado editorial ainda são brancas e privilegiadas. Poucas são as mulheres pobres, negras e indígenas contempladas pelo mundo da literatura, embora esse também seja um cenário em mudança, ainda que lentamente. E isso muito tem a ver com acesso à educação e aparatos culturais.

Além disso, há a presença de temas nunca antes abordados em obras de homens, como maternidade (pelo viés da mulher), aborto, assédio, violência contra mulher, relacionamentos homoafetivos entre mulheres, entre outras temáticas. Ou de temas que até foram trabalhados, mas de modo inadequado antes, por meio de suposições, achismos e esteriótipos.

Quero ler mais mulheres. Por onde começo?

Uma ideia interessante para conhecer mais escritoras na contemporaneidade é buscar ler gêneros literários diversos, ou seja, diferentes maneiras de expressão: romance, conto, crônica, poema, HQs, entre outros.

Procure também livros de mulheres de diferentes realidades sociais, raças,
orientação sexual etc. Afinal, ler apenas mulheres brancas e de classes sociais privilegiadas não é tão plural como a maioria pensa.

Por fim, minha dica é procure por autoras em editoras menores porque são elas que mais abrem portas para as mulheres, sobretudo no Brasil. E, se possível, ajude a divulgar o trabalho dessas mulheres em suas redes sociais. Isso faz toda a diferença. Fortalece!

“Mas, Estela, não sei de nenhum nome ou sei poucos nomes de autoras”. Então, vamos de indicações!

7 escritoras brasileiras contemporâneas para ler

A partir daqui, você não terá desculpa para não ler as mulheres que estão fazendo literatura brasileira acontecer! Listo aqui apenas 7 autoras, com dor no coração, porque poderia passar o dia fazendo indicações, mas vamos lá!

1. Angélica Freitas

Tatyana Domen / Dicas de Mulher

Dentre os temas mais comuns abordados pela poeta gaúcha Angélica Freitas estão o relacionamento entre mulheres; preconceito; amor próprio; machismo, idealização da mulher e inquietações diante da sociedade e política brasileira. Tudo isso com uma pitada maravilhosa de humor. Seus livros são: Rilke Shake (2007); Um útero é do tamanho de um punho (2012), Prêmio APCA de poesia (2012); Canções de atormentar (2020).

2. Natalia Borges Polesso

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A Natalia B. Polesso é poeta, romancista, contista e tradutora. Sua produção, sobretudo a narrativa, tem como objetivo dar visibilidade às mulheres lésbicas, isso não só em relacionamentos homoafetivos, mas em diversas situações cotidianas da vida. Seus livros são: Recortes para álbum de fotografia sem gente (2013 – contos), Prêmio Açorianos de 2013; Coração à corda (2015 – poesia); Amora (2016 – contos), Prêmio Jabuti em 2016; Pé atrás (2018 – poesia); Controle (2019 – romance), Prêmio Minuano de Literatura 2020.

3. Conceição Evaristo

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Conceição Evaristo é uma das maiores escritoras brasileiras da atualidade, conhecida por suas “escrevivências“. Ela escreve poemas, contos e romances, nos quais são temas recorrentes o cotidiano da mulher negra (relacionamentos, violência, maternidade, sexualidade), escravização, ancestralidade etc. Coloque na sua lista de leituras: Ponciá Vicêncio (2003 – romance); Becos da memória (2006 – romance); Poemas da recordação (2017 – poemas); Insubmissas lágrimas de mulheres (2011 – contos); Olhos d’água (2014 – contos), Prêmio Jabuti em 2015; Histórias de leves enganos e parecenças (2016 – contos). Além desses livros, a autora tem textos em diversas antologias e coletâneas.

4. Aline Bei

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Bei é dona de uma voz literária doce e, ao mesmo tempo, arrasadora. Seu primeiro e mais conhecido livro, foi o romance O peso do pássaro morto (2017), vencedor do Prêmio São Paulo de Literatura em 2018. Nessa obra, trata de temas como dores, solidão, estupro, maternidade, morte (tudo com linguagem poética, juro!). Seu último lançamento foi o livro Pequena coreografia do Adeus (2021). Além disso, possui dois contos avulsos na Amazon, como “Rua sem saída” e “Ego” e publica seus textos em revistas e redes sociais.

5. Ana Paula Maia

Tatyana Domen / Dicas de Mulher

Ana Paula Maia começou a publicar na internet. É conhecida por ser uma autora do mundo “masculino”, porque em suas obras apenas homens são personagens, há ausência quase total de mulheres. Seus personagens são homens brutos e violentos, que trabalham em áreas pouco desejáveis ou vivem em prisões. Ao ser questionada pela mídia sobre ser mulher não escrever sobre mulheres, Maia já deixou bem claro que, como mulher, pode escrever sobre o que quer! São livros da autora: O habitante das falhas subterrâneas (2003); A guerra dos bastardos (2007); Entre rinhas de cachorros e porcos abatidos (2009); De gados e homens (2013); Assim na terra como embaixo da terra (2017), Prêmio São Paulo de Literatura em 2018; Enterre seus mortos (2018), Prêmio São Paulo de Literatura em 2019. Além de escritora, é uma excelente roteirista.

6. Márcia Wayna Kambeba

Tatyana Domen / Dicas de Mulher

Márcia é uma poeta indígena, da etnia Omágua Kambeba, em luta constante pelos direitos das mulheres indígenas, tanto na sociedade de modo geral como nas aldeias. Além de trazer essas questões para sua obra, temas como educação e saúde precárias, saneamento básico, territórios invadidos, desmatamento e poluição também estão presentes. Não deixe de ler: Ay kakyri Tama – Eu moro na cidade (2018 – poemas) e Saberes da floresta (2020 – ensaios).

7. Lubi Prates

Tatyana Domen / Dicas de Mulher

A paulista Lubi Prates é poeta, tradutora e editora, fundadora da editora Nosotros. Seus livros partem sobretudo do reconhecimento da mulher enquanto negra, levando em conta não só a aparência física, mas suas histórias e seus ancestrais, ou seja, sua identidade. Seu livro de poemas Um corpo negro (2018) foi finalista do 61º Prêmio Jabuti e do 4º Prêmio Rio de Literatura. Também publicou Coração na boca (2012) e Triz (2016). Além disso, tem se destacado pela tradução da poesia completa da poeta Maya Angelou.

Agora é com você: leia e espalhe a literatura escritas por mulheres por onde quer que vá. E se quer conhecer ainda mais autoras, espia só esta lista de 25 escritoras famosas para incluir na sua vida!

Fez Letras, mas se encontrou na área de Comunicação. Mediadora do clube de leitura #LeiaMulheres e autora do livro de poemas 'O rio seco que vive em mim'. Gosta de planta, de bicho e de gente, mas mais ainda de histórias.