COLUNA

Por que as mulheres bi são fetichizadas?

Dicas de Mulher

As mulheres bissexuais não são objetos sexuais à disposição do prazer masculino

Bissexualidade é o nome dado à orientação sexual daquelas pessoas que se atraem tanto pelo estereótipo feminino quanto pelo estereótipo masculino. Para algumas pessoas, esse conceito se torna difícil de entender pois estão acostumadas a pensar de forma muito ingênua e simplista, como se todo mundo se definisse como sendo heterossexual OU homossexual. Mas existem outras possibilidades para além disso, como os bissexuais: pessoas que podem se apaixonar e/ou sentir atração sexual pelo mesmo gênero ou gêneros diferentes, não necessariamente ao mesmo tempo.

Isso quer dizer que mulheres bissexuais podem viver um casamento com um homem sem necessidade de estar com uma mulher em simultâneo – ou viver um casamento com uma mulher sem estar com um homem concomitantemente, por exemplo. O fato é que a mulher bissexual está aberta a se atrair e a se apaixonar por homens ou mulheres, assim como uma mulher heterossexual está aberta a se atrair e a se apaixonar por homens mais novos ou mais velhos; mais baixos ou mais altos… e o fato de ela gostar das duas características, não faz com que ela fique com um homem baixo e um homem alto ao mesmo tempo! Entendido isso, podemos falar sobre fetichização…

O que é fetiche, afinal?

De modo geral, para a Psicologia, fetiche é um objeto, parte do corpo ou comportamento que provoca uma excitação sexual específica para um determinado sujeito. Há pessoas com fetiche por pés, por exemplo, que se excitam com o contato, beijos e carícias nos pés da pessoa amada. Outras, têm fetiches por fazer sexo em lugares inusitados, ou por certas posições de submissão e dor. O fetiche faz parte do imaginário sexual humano e se torna problemático quando o prazer sexual se resume apenas àquela situação fetichizada. Imaginem que problemático seria se alguém só tivesse prazer se transasse em lugares inusitados; ou se só alcançasse o orgasmo se os pés do outro fossem o centro da transa… aí não tem parceira ou parceiro que aguente tanta obsessão, certo?

O problema é que os fetiches, apesar de serem algo muito particular, estão no imaginário coletivo. Alguns deles são os “preferidos” dos homens porque, geralmente, os coloca numa posição de poder e dominação diante da mulher. Nesse caso, a fantasia sexual exclui a subjetividade da pessoa que também está ali envolvida na relação e a transforma em um objeto inanimado, que existe somente para satisfazer uma fantasia do parceiro.

E o que tudo isso tem a ver com a bissexualidade?

A indústria pornográfica alimenta muitos fetiches que objetificam as mulheres. Um deles está na cena de ménage à trois, em que um homem se delicia sexualmente com duas mulheres, seja as assistindo em uma relação, seja participando como o “macho alfa”. Isso até pode ser um comportamento comum no reino animal, onde os leões e outros tantos bichos têm um macho que assume o topo da hierarquia dentro de seu bando e tem como privilégio, copular com todas as fêmeas. Porém, a sexualidade humana se difere dos animais pois somos seres conscientes, linguísticos e podemos domar melhor nossos “instintos”.

Publicidade

Mulheres, sendo ou não bissexuais, não estão “à disposição de machos alfa”, e elas devem se satisfazer como bem entenderem, a partir de seus desejos e escolhas pessoais. No imaginário de um homem que fetichiza mulheres bissexuais, ambas estariam se relacionando não pelo prazer delas, mas sim, para satisfazer sua posição de macho alfa, que detém mais de uma mulher ao mesmo tempo, como se as duas fossem objetos que estão a serviço de suas demandas sexuais.

Mas se uma mulher bissexual gosta de homens e de mulheres, qual seria o problema de um homem idealizar essa situação?

Como eu disse anteriormente, uma mulher bissexual pode ficar com um homem e uma mulher ao mesmo tempo, mas isso não é a regra. Mulheres bissexuais que desejam ficar com outras mulheres não fazem isso para um homem, e sim, para seu próprio prazer. O problema, então, é que a indústria pornográfica e o machismo social criam esse cenário idealizado e deturpado de que as mulheres bissexuais só têm relação entre si se houver um homem envolvido, para o prazer dele. Ou que topariam um sexo a três com o parceiro e outra mulher, só por ser bissexual. Aqui, dizemos que elas são fetichizadas porque elas, bem como a sua sexualidade, se tornaram um objeto para o prazer masculino, excluindo-se sua vontade e subjetividade.

Alguns discursos reforçam esse tipo de pensamento, mas podemos fazer muitas coisas para mudar!

É importante entendermos que algumas posturas e discursos são bifóbicos, ou seja, reproduzem o preconceito contra pessoas bissexuais. A crença de que bissexuais são pessoas indecisas, promíscuas e frases como “ela deixou de ser lésbica e agora fica com homens”; ou “só quer chamar atenção”, revelam desinformação e falta de empatia com a sexualidade alheia, estando muito longe de serem verdade. Por isso, podemos nos mobilizar e tirar comentários desse tipo do repertório, além de informar as pessoas a nossa volta sobre a problemática.

Assim, compreenderemos que a orientação sexual de alguém não tem nada a ver com os fetiches dos outros. O fato de uma mulher ser bissexual não dá ao homem o direito de imediatamente se imaginar (e, pior ainda, propor!) uma cena de “ménage à trois” como se esta mulher estivesse ali disponível para satisfazê-lo. Somos serem capazes de nos respeitarmos em nossa natureza sexual, podemos ver o outro para além de um objeto e é isso que faz o sexo ser muito mais do que um ato de reprodução humana, mas sim um ato de relação, respeito, prazer e reciprocidade.

* Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do Dicas de Mulher.

Psicanalista e Palestrante, graduada em Psicologia e em Letras, com Mestrado e Doutorado em Linguística e Pós-Graduada em Sexualidade Humana. Dedica sua carreira ao desenvolvimento de mulheres líderes no trabalho, nos relacionamentos e na vida. É autora do livro "A linguagem da loucura" e empresária, ama comunicação, esportes, viagens e celebrações.