COLUNA

Como eu posso falar de sexo com a minha filha?

Dicas de Mulher

Tanto na infância quanto na adolescência, há muitas questões sobre o assunto. Mas qual a melhor forma de abordar isso em casa?

Aposto que você, leitora, gostaria de ter conversado mais com sua mãe quando adolescente, especialmente sobre coisas “proibidas para menores”. Também aposto que a maioria das coisas que você aprendeu sobre sexo foi fora de casa, com as amigas, em revistas “teen”, na TV ou entre cochichos na escola.

De fato, para nós, mulheres adultas, houve muita censura quando o assunto era sexo. Raras eram as colegas que podiam falar abertamente sobre isso com a família, e a regra era “tremer na base” se nossos pais soubessem algo da nossa vida íntima. Perder a virgindade, então, era um grande tabu e, mesmo quando menstruamos pela primeira vez, víamos nossas mães um pouco desconcertadas ao ensinar a usar um absorvente.

Se você não se identifica com isso, cara leitora, você foi uma das privilegiadas que pôde falar abertamente de sua intimidade com sua mãe – e provavelmente a fonte de qualquer informação segura que tenha chegado às suas colegas.

Justamente pelo fato de a maioria de nós não termos tido esse privilégio, ficamos perdidas em relação ao que fazer com as nossas filhas. Agora, no papel de mães e adultas, temos medo de cometer a mesma cena do passado, deixando as crianças e adolescentes sem informação. Por outro lado, morremos de medo de pecar pelo excesso, de assustar, de sermos invasivas demais ou mesmo de incentivar uma vida sexual precoce.

Por onde começar esse papo?

É preciso “muita calma nessa hora”, pois as novas gerações já nasceram conectadas e a percepção que têm sobre o sexo é bastante diferente de quando éramos jovens. Na nossa época, o que sabíamos sobre isso era fruto de um “telefone sem fio”, fofocas no banheiro, filmes às escondidas e raros livros eróticos.

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Me lembro de ter ganhado um compilado de manuais sobre anatomia quando comecei minhas curiosidades sexuais, deixando minha mãe apavorada. Por outro lado, a garotada de hoje tem um mundo de informações que, infelizmente, podem fugir ao controle dos pais. Tablets, smartphones e redes sociais ampliam o acesso a conteúdos para adultos – e fica aqui o meu alerta e apelo para que a família restrinja e supervisione o uso dessas ferramentas com menores de idade!

Nesse compartilhamento infinito de dados, qualquer coisa pode chegar às nossas filhas, desde informação de qualidade, voltada ao seu bem-estar e saúde íntima; até notícias enganosas, imagens violentas, abusivas e pornográficas. Justamente por isso, ao invés de ficarmos neuróticas buscando o controle de absolutamente tudo o que acontece ao nosso redor, é muito mais eficaz sermos uma fonte de informação segura, em que nossas filhas encontrem referência e confiança.

Minha filha não se abre comigo, o que fazer?

Em meu consultório, é muito frequente escutar mães se queixando de não conseguirem acessar suas filhas. Na maioria desses casos, o diálogo é imposto por parte dos pais “repentinamente”, como se, a partir de certa idade, a pré-adolescente devesse, necessariamente, se sentir confortável para falar de seus sentimentos.

Mas não é assim que a banda toca! Diálogo e comunicação são construídos desde que os filhos nascem, e muitas vezes confundimos conversa como monólogo. O fato de falarmos muito com nossos filhos não significa que estejamos os escutando. Muitas mães se concentram tanto em falar que se esquecem do primordial: ouvir. E, pior ainda: quando ouvem, já estão pensando no sermão que darão em seguida. Nesse cenário, a mãe tem a impressão de que está abrindo o diálogo porque está falando mais, mas não percebe que coloca os julgamentos à frente de qualquer conversa. Quando o assunto é sexo, as coisas ficam piores, pois os próprios adultos ainda guardam muitos tabus sobre isso.

Os tabus sexuais no diálogo familiar

A nossa vida sexual envolve preferências, desejos inconscientes, fantasias que são difíceis de acessar, são muito íntimas. Mesmo quando se trata da nossa própria sexualidade, ainda encontramos entraves, então no momento em que nos deparamos com a vida sexual de nossas filhas, as coisas ficam ainda mais complexas, pois estamos acostumadas a vê-las de uma maneira “pura”, intocável, como os bebês que outrora carregávamos no colo.

Por tudo isso, se torna tão difícil acessar nossas filhas quando esse assunto vem à tona: existe muita vergonha e medo de falar daquilo que nos tira do lugar de pureza com o qual nos acostumamos ao longo da infância. O fato é que não adianta lutar contra o tempo: as meninas se tornarão mulheres e os desejos sexuais desabrocharão em determinada fase.

E quando eu sei que essa fase vai chegar? Existe uma hora exata em que devo conversar sobre isso?

Em termos de desenvolvimento sexual, cada indivíduo tem seu tempo. O momento exato de trazer o tema à tona é aquele em que as filhas demonstram que existe uma questão. São elas que vão nos comunicar, seja por palavras, seja por gestos, por mudanças de comportamento, ou mesmo por um olhar diferente, que há algo que precisa ser dialogado.

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Concentre-se em ouvir exatamente o que ela está perguntando. Muitas vezes queremos explicar aquilo que nós achamos importante, mas a pergunta das garotas muitas vezes é mais simples do que parece. Quanto menos forçada for essa conversa, mais frutos ela renderá. Se isso for trabalhado desde a infância, fica muito mais fácil!

Mas eu não consegui ter esse diálogo na infância, e agora? O que fazer com minha filha adolescente?

De fato, nesses casos, a abertura para o diálogo é mais difícil. Mas nem tudo está perdido! É importante, acima de tudo, demonstrar uma mudança de postura sobre o assunto. Como você mesma reage quando o assunto é sexo? Fica constrangida? Evita falar? Muda o tema? Nossas filhas nos conhecem a fundo para perceber nossas reações. Se pudermos nos mostrar mais confortáveis diante disso, elas também sentirão que há uma abertura para o diálogo.

Não adianta forçar uma conversa que é desconfortável para você: nesses casos, eu sugiro que você mesma possa buscar a terapia ou profissionais que te ajudem a se sentir melhor e então, só depois da sua mudança, você poderá ver uma possível mudança na relação mãe e filha.

Nem tudo são palavras!

Muitas vezes, nos forçamos a dizer “timtim por timtim” determinada coisa. Queremos explicar, desenhar, mostrar, na melhor das intenções, como prevenir ISTs (infecções sexualmente transmissíveis) ou gestações precoces. Mas muito provavelmente isso soará como uma aula de ciências bastante desconfortável para as duas partes. Existe uma diferença entre ensinar e conversar: ensinar é passar algo que você sabe para alguém que não sabe; conversar é trocar saberes. Quando o assunto é educação sexual, estamos no campo da conversa, pois só nós mesmos sabemos da nossa intimidade, dos nossos desejos.

Por isso, às vezes vale mais um abraço, um olhar de acolhimento, uma pergunta sincera do que um “manual perfeito de sexualidade adolescente”. Um livro interessante sobre o assunto, um filme que possa ser assistido por vocês duas, uma notícia na mídia sobre o tema podem ser uma ótima forma de trazer, de maneira leve, o tema “sexo” para a relação de vocês. Nessas pequenas oportunidades, podemos nos manter atentas, ouvindo sem julgamentos, analisando com cuidado e amor o que nossas filhas querem expressar, a partir de uma vivência que é só delas. E só então poderemos, de fato, falar de sexo com franqueza, sobre os cuidados íntimos, sobre a importância do amor próprio, sobre o prazer e sobre a beleza que é a sexualidade feminina.

* Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do Dicas de Mulher.

Psicanalista e Palestrante, graduada em Psicologia e em Letras, com Mestrado e Doutorado em Linguística e Pós-Graduada em Sexualidade Humana. Dedica sua carreira ao desenvolvimento de mulheres líderes no trabalho, nos relacionamentos e na vida. É autora do livro "A linguagem da loucura" e empresária, ama comunicação, esportes, viagens e celebrações.