COLUNA

O preconceito mascarado de frustração na busca por um parceiro

Dicas de Mulher

A angústia que aparece em forma de preconceito quando a cortina do conservadorismo cai

Nas últimas semanas, dois famosos se assumiram bissexuais nas redes sociais. Rodrigo Simas declarou acreditar na “liberdade de escolha”, dizendo ser um “cara livre”; e Pedro Sampaio revelou que está namorando um jogador de vôlei. Diante dos fatos, caiu uma chuva de comentários bifóbicos, muitos deles dizendo que “virou moda ser gay”.

Essa história também me lembra uma conversa que tive com um motorista de aplicativo, logo que cheguei para curtir o carnaval em Belo Horizonte. Eu estava perguntando a ele sobre os melhores bloquinhos para passar meus dias de folia até que ele diz: “Só não se anima muito porque aqui em Minas tem bastante gay e as mulheres reclamam que não conseguem mais ficar com homem nenhum”.

Essa frase começou a ser familiar nos últimos tempos. É como se o fato de os homens se sentirem livres para viver sua sexualidade, sem precisar se esconder, desse um “curto circuito” na cabeça das mulheres heterossexuais, como se agora houvesse menos “oferta” de homens no mercado.

Um breve passeio por fatos históricos…

O primeiro equívoco é imaginar que agora há mais pessoas bi ou homossexuais do que no passado. Na verdade, desde a Antiguidade Clássica até a Idade Média, nem existia um nome específico para a homossexualidade, pois ficar com pessoas do mesmo sexo/gênero era absolutamente comum. Na Grécia e na Roma Antigas, o sexo entre homens e mulheres tinha como única finalidade a procriação. Há, inclusive, registros de uma poeta, Safo da ilha grega de Lesbos, que escrevia sobre seus desejos por mulheres no século 6 a.C – e é por causa dela que utilizamos os termos sáfica e lésbica para mulheres que se relacionam com mulheres.

Isso quer dizer que a relação sexual com pessoas do mesmo sexo/gênero não é nada recente. O que ocorre é que por muitos anos, especialmente após a Idade Média, tivemos movimentos sociais, religiosos e culturais que negaram essa parte da expressão sexual humana e passaram a vê-la como um “pecado da carne”. Hoje, as pessoas se sentem mais seguras para ter experiências sexuais, para assumir seus desejos e vontades.

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E como fica a mulher hétero nesse contexto?

Outro grande equívoco está em acreditar que as relações são um grande mercado em que deveria haver homens heterossexuais na mesma proporção de mulheres heterossexuais – como se fossem “as metades da laranja” prontas para se encontrarem. O fato de haver mais pessoas assumindo uma homossexualidade ou uma bissexualidade não retira de ninguém a possibilidade de encontrar um par amoroso. Pensando de forma muito honesta, eu preferiria encontrar pessoas sinceras sobre sua sexualidade, ao invés de me relacionar com alguém que finge ser o que não é por medo de se assumir.

O medo da liberdade do outro diz mais sobre mim do que sobre o outro

Na Psicanálise, uma frase famosa de Freud diz que: “Quando Pedro me fala de Paulo, sei mais de Pedro que de Paulo”. Isso quer dizer que, quando falam sobre a vida sexual de Rodrigo Simas ou de Pedro Sampaio, é mais importante entender o incômodo das pessoas do que de fato a sexualidade dos famosos em questão.

Me questiono quais são os motivos que levam tantas mulheres héteros a ficarem inseguras com a “falta de homens” que possam amá-las. Minha teoria é a de que nossa autoestima e objetivo de vida estiveram sempre ligados a uma relação tradicional, tal qual nos contos de fadas, em que tudo fluía muito bem sem que a princesa se esforçasse para compreender seus próprios desejos.

Mas, longe dos contos de fadas, temos uma vida real batendo à porta: um outro que também tem desejos, que podem fugir às nossas expectativas. Além disso, pode haver outras formas de felicidade para além das relações tradicionais, que não dependam de encontrar a “outra metade da laranja”. Talvez, compreendendo melhor isso, possamos também nos alegrar com a alegria daqueles que se encontram e podem amar, independentemente da orientação sexual.

* Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do Dicas de Mulher.

Psicanalista e Palestrante, graduada em Psicologia e em Letras, com Mestrado e Doutorado em Linguística e Pós-Graduada em Sexualidade Humana. Dedica sua carreira ao desenvolvimento de mulheres líderes no trabalho, nos relacionamentos e na vida. É autora do livro "A linguagem da loucura" e empresária, ama comunicação, esportes, viagens e celebrações.