Bem-estar

Maternidade sustentável é sobre menos coisas e mais presença, diz Fe Cortez

Dicas de Mulher

As vivências de mães que educam filhos para um futuro sustentável em que o planeta estará mais verde

Atualizado em 02.02.24

As mudanças climáticas são preocupantes – isso é fato! Assim, torna-se cada vez mais urgente repensarmos nossos hábitos de consumo e de vivência. Na contramão da cultura do descartável, já existem diversos termos e tendências que visam diminuir os impactos ambientais. Um exemplo é a maternidade sustentável, difundida por ativistas, empresárias, educadoras, influenciadoras digitais e escritoras, entre elas, Fernanda Cortez – fundadora da Menos 1 Lixo.

Em conversa com o Dicas de Mulher, Fernanda conta a sua história, esclarece dúvidas sobre o conceito e alerta sobre as falsas práticas de sustentabilidade. Esse é o estopim para começarmos a pensar: qual é o mundo que queremos deixar para a futura geração? Ao educar com menos consumo e desperdício, valorizando a saúde, alimentação, cultura e diversidade, quiçá, viveremos em mais harmonia com o planeta. Assuma esse protagonismo na sua maternidade!

Menos consumo e mais presença

Para Fernanda, a maternidade sustentável envolve a tríade emocional, financeira e ambiental. “Muitas vezes, quando uma mulher engravida, a primeira coisa que ela planeja é o enxoval do bebê”, ou seja, antes mesmo de chegar ao mundo, a criança já está envolvida na cultura do consumismo. Além de exigir um investimento financeiro alto e desnecessário, o enxoval descartável gera muitos lixos. Claro, você será bombardeada por anúncios de produtos infantis, verá brinquedos que nunca teve e acessórios tecnológicos. Entretanto, tudo isso é realmente necessário?

Educar uma criança precisa envolver responsabilidade social. Assim, a “sustentabilidade é uma forma de enxergar a maternidade com mais simplicidade, com menos coisas e mais presença na vida do bebê e da mãe”. O conceito também incentiva a reeducação dos impactos ambientais e a formação de um ser humano atento à natureza.

Em meados de 2012, quando assistiu ‘Trashed’, a sustentabilidade virou uma chavezinha em Fernanda: “mudou a minha visão de mundo, porque o documentário mostra que a gente está transformando o planeta em um grande lixão a céu aberto”. Três anos depois, em 2015, ela fundou o Menos 1 Lixo – projeto de educação ambiental com destaque no ativismo corporativo.

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Maternidade sustentável no seu dia a dia: é possível!

Com o incômodo pregado no pensamento, Fernanda tomou uma decisão muito simples: substituiu o copo descantável por um reutilizável. Esse foi só o começo. Com o projeto Menos 1 lixo, a influenciadora soma várias campanhas e iniciativas de mobilização, entre elas, o “Pare de Chupar”, que impulsionou a lei de proibição dos canudinhos plásticos no Rio de Janeiro em 2018.

‘Mas, Fernanda, a sustentabilidade dá muito trabalho! Eu não tenho tempo para pensar nisso e cuidar das crianças!’ Calma, você verá adiante que é possível sim. O problema é que estamos ‘viciados’ em uma rotina de consumo. Ao quebrar o padrão, surgem novas perspectivas. A ativista ambiental recomenda:

Ao invés de usar somente fralda descartável, use a reutilizável (que é mais barata, ecológica e gera menos lixo). Ao invés de comprar um monte de produtos para o seu filho (como shampoo, condicionador e sabonete – que são uma grande invenção da indústria), escolha apenas um sabonete, feito de matéria-prima natural e biodegradável, compatível com a pele criança. Ao invés de comprar vários brinquedos, tenha menos coisas. Também é possível alugar brinquedos ou comprar em um brechó.

– Fernanda Cortez

Nos primeiros meses de vida de um bebê, as vestimentas ficam pequenas muito rápido. Assim, o enxoval é uma despesa dispensável. Você pode optar pela locação, aceitar doações e repassar os itens posteriormente. Outra atitude positiva é a escolha dos produtos: “não uso algodão; o lenço umedecido, apenas quando vou para a rua e, ainda assim, uso marcas biodegradáveis disponíveis no mercado, sem perfume e sem componentes químicos”.

Fernanda também pratica o upcycling: “a gente usa uma toalhinha de pano, que comprei na Morada da Floresta. Eu limpo o bumbum do bebê com água, quando está muito suja, com água e sabão, depois, lavo a toalha”. A prática consiste em reaproveitar itens, evitando o descarte. Além de reduzir a produção de lixo, isso diminui o consumo.

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Sabe os móveis que você parcela no cartão em várias vezes para montar um quarto de bebê dos sonhos? Vale pensar em alternativas. Fernanda, por exemplo, montou o quarto de seu filho, Tito, reaproveitando o mobiliário da família – “demos uma outra proposta. Então, a cômoda, que tinha sido da minha mãe e também foi minha, hoje está no quarto dele”.

A prática do upcycling ainda vai além, por exemplo, “pode acontecer quando a gente transforma um lençol antigo em saquinhos para pendurar as fraldas”. Ao transformar coisas antigas em novas, você exercita a criatividade, economiza, faz bem para o planeta e passa uma mensagem inspiradora para as crianças. Então, que tal entrar na onda sustentável do faça você mesmo o enxoval de bebê?

Pensar no futuro é educar desde agora

Canva

Antes de ser um benefício, a preservação do meio ambiente é uma necessidade! Todas as mães, pais, enfim, o mundo inteiro deveria estar pensando sobre o assunto e buscando soluções para um futuro verde. Como toda ação gera uma reação, ao praticar a maternidade sustentável, “você compra menos coisas”, pontua Fernanda. Essa forma de maternar também impacta a vida da criança a longo prazo.

Assim como Fernanda, a educadora menstrual e mãe da Luna, Larissa Agostini, escolheu a maternidade sustentável. Ela foi criada em contato com a natureza, então, quando se tornou mãe, quis passar para a sua filha os valores que aprendeu com seus pais. Os benefícios já são perceptíveis:

Conforme a minha filha cresce, vejo como isso impacta positivamente seu desenvolvimento, tanto no relacionamento interpessoal, na relação que ela tem com as experiências do mundo externo, quanto no modo como ela enxerga e se vê parte integrante desse meio. A relação que ela tem com a natureza, com os animais e pessoas é bastante livre e consciente também.

– Larissa Agostini

A atitude diária, para Larissa, é uma grande escola. A filha aprende na prática sobre a importância da sustentabilidade. Contudo, isso não dispensa a importância de uma educação transformadora. Por isso, a mãe escolheu uma instituição de ensino adepta da ‘Pegagogia Waldorf e Pikler’: “preza pela integração total do ser humano com a natureza, têm benefícios para a capacidade cognitiva, socialização, prevenção de depressão, hiperatividade e ansiedade, além de estimular a criatividade”.

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A qualidade de vida familiar também é beneficiada pelas práticas sustentáveis. No dia a dia, você pode incluir passeios ao ar livre, fazer piqueniques, promover uma oficina de brinquedos, entre outras atividades. A criança pode ajudar nos afazeres domésticos, por exemplo, retirar o lixo e separar as embagens recicláveis. Um vínculo afetivo fortalecido na empatia, cuidado e amor por todos os seres vivos.

Checklist dos benefícios

É importante ressaltar que a maternidade sustentável não pode ficar somente no discurso, ela precisa ser colocada em prática. Às vezes, seria mais cômodo comprar tudo pronto, porém o cômodo sai caro – para você e para o meio ambiente. Quando Tito fez um aninho, Fernanda celebrou com uma festa lixo zero. O tema foi árvore e a criançada simplesmente amou! Ao aderir a prática, você:

  • Compra menos e abre espaço para a criatividade.
  • Desenvolve percepção e consciência ambiental.
  • Gasta menos com itens fúteis.
  • Incentiva a autonomia da criança.
  • Investe em tempo de qualidade.

Ser uma mãe sustentável é um ato de amor pela vida. É oferecer uma infância mais saúdavel, feliz e criativa para seu filho. É semear o futuro. No entanto, também é um desafio. Com a visibilidade dos movimentos em prol de um cotidiano mais sustentável, grandes empresas transformaram a causa em um meio de ganhar dinheiro.

Capitalismo Verde não é maternidade sustentável

Apesar de o conceito de maternidade sustentável ir de encontro a uma reflexão sobre os hábitos atuais, principalmente os de consumo, ao pesquisar sobre o assunto na internet, logo surgem milhares de anúncios personalizados de marcas que atuam no nicho. Basta clicar para perceber que a maternidade sustentável vendida não cabe no bolso da maioria das mães brasileiras.

A pergunta que fica é: maternidade sustentável para quem? Fernanda e Larissa concordam que é preciso cuidado para não cair nas armadilhas do ‘capitalismo verde’ ou ‘ecocapitalismo’ e do greenwashing. Essas abordagens consistem, respectivamente, em explorar recursos naturais de forma minimamente invasiva; e na falsa ideia de sustentabilidade, com propagandas e informações enganosas sobre a origem dos itens comercializados. A dica da educadora menstrual é:

Você não precisa de nada que não seja consciência, informação e vontade para praticar uma vida mais ecológica e sustentável. Há um grande mito, um tabu, de que ser sustentável é caro, porém isso não é verdade. Você não precisa comprar um enxoval com 100 peças de algodão orgânico. Seja sustentável comprando três bodys em vez de 30. Aposte em práticas possíveis, eliminando atitudes e produtos, muitas vezes, desnecessários e prejudiciais para o desenvolvimento da criança.

– Larissa Agostini

A lógica capitalista de consumo jamais será sustentável. Não considera os limites ecológicos do planeta e as desigualdades sociais. O mercado é uma ferramenta de exploração em busca do lucro. Por isso, se for comprar de grandes marcas, conheça os valores da empresa, especule os preços e o custo-benefício. Uma ideia legal é participar de redes de apoio e conversas sobre o assunto com outras mulheres. Sempre que possível, fortaleça mães empreendedoras, compre de um fornecedor local, faça doações ou troque em brechós o enxolver que o bebê não irá mais usar.

Também não é preciso fazer uma mudança drástica da noite para o dia. Comece devagar. Primeiro, pesquise muito sobre o assunto e siga as redes sociais de mulheres empenhadas na causa. Nas palavras de Fernanda, “a maternidade sustentável tem a ver com uma nova lente”. O novo exige tempo e recursos. “Mas acho que uma família, assim como qualquer pessoa que quer começar uma rotina nova e sustentável, pode escolher uma coisa”. Por exemplo, usar fraldas de pano ou evitar comprar um monte de brinquedos de plástico.

Antes de encerrar a conversa, Larissa faz um apontamento muito necessário: “esse assunto não deve ficar somente entre as mães. Eu vejo que a sustentabilidade tem se tornado uma responsabilidade materna, e as mães já têm tanta carga! Então, é um pouco delicado a gente colocar mais essa carga em cima das mulheres”. Mães cansadas não podem salvar o planeta sozinhas.

Está na hora de abranger o conceito. Além da maternidade, precisamos falar sobre parentalidade sustentável, incluindo, assim, os demais cuidadores de uma criança. A participação familiar ativa e a conscientização social são importantes para evoluir os debates e a criação de políticas públicas alinhadas à causa ambiental, promovendo uma real transformação na forma como educamos e como lidamos com o futuro do planeta.

Formada em Jornalismo, é apaixonada por livros e boas histórias (ficcionais ou não). Trabalha com conteúdo e fotografia, e nas horas vagas gosta de ler, escrever e pedalar.